Vejam esta notícia divulgada no site r2cpress.
LEMBRAM DO JUIZ QUE ENTROU NA JUSTIÇA CONTRA O CONDOMÍNIO EM QUE MORA, POR CAUSA DO TRATAMENTO DE “VOCÊ” DADO PELO PORTEIRO?
POIS É, SAIU A SENTENÇA. LEIAM ABAIXO.
POIS É, SAIU A SENTENÇA. LEIAM ABAIXO.
UMA VERDADEIRA AULA DE DIREITO E DE PORTUGUÊS!
Processo distribuído em 17/02/2005, na 9ª vara cível de Niterói – RJ
PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO – COMARCA DE NITERÓI – NONA VARA CÍVEL
Processo n° 2005.002.003424- 4
S E N T E N Ç A
Cuidam-se os autos de ação de obrigação de fazer manejada por ANTONIO
MARREIROS DA SILVA MELO NETO contra o CONDOMÍNIO DO EDIFÍCIO LUÍZA
VILLAGE e JEANETTE GRANATO, alegando o autor fatos precedentes ocorridos
no interior do prédio que o levaram a pedir que fosse tratado
formalmente de “senhor”.
Disse o requerente que sofreu danos, e que esperava a procedência do
pedido inicial para dar a ele autor e suas visitas o tratamento de ‘
Doutor, senhor” “Doutora, senhora”, sob pena de multa diária a ser
fixada judicialmente, bem como requereu a condenação dos réus em dano
moral não inferior a 100 salários mínimos. (…)
DECIDO: “O problema do fundamento de um direito apresenta-se
diferentemente conforme se trate de buscar o fundamento de um direito
que se tem ou de um direito que se gostaria de ter.” (Noberto Bobbio, in
“A Era dos Direitos”, Editora Campus, pg. 15).
Agiu o requerente como jurisdicionado, na crença de seu direito.
Plausível sua conduta, na medida em que atribuiu ao Estado a solução do
conflito.
Não deseja o ilustre Juiz tola bajulice, nem esta ação pode ter
conotação de incompreensível futilidade. O cerne do inconformismo é de
cunho eminentemente subjetivo, e ninguém, a não ser o próprio autor,
sente tal dor, e este sentenciante bem compreende o que tanto incomoda o
probo Requerente.
Está claro que não quer, nem nunca quis o autor, impor medo de
autoridade, ou que lhe dediquem cumprimento laudatório, posto que é
homem de notada grandeza e virtude. Entretanto, entendo que não lhe
assiste razão jurídica na pretensão deduzida.
“Doutor” não é forma de tratamento, e sim título acadêmico utilizado
apenas quando se apresenta tese a uma banca e esta a julga merecedora de
um doutoramento. Emprega-se apenas às pessoas que tenham tal grau, e
mesmo assim no meio universitário. Constitui-se mera tradição referir-se
a outras pessoas de ‘doutor’, sem o ser, e fora do meio acadêmico.
Daí a expressão doutor honoris causa – para a honra -, que se trata
de título conferido por uma universidade à guisa e homenagem a
determinada pessoa, sem submetê-la a exame.
Por outro lado, vale lembrar que “professor” e “mestre” são títulos
exclusivos dos que se dedicam ao magistério, após concluído o curso de
mestrado. Embora a expressão “senhor” confira a desejada formalidade às
comunicações – não é pronome -, e possa até o autor aspirar
distanciamento em relação a qualquer pessoa, afastando intimidades, não
existe regra legal que imponha obrigação ao empregado do condomínio a
ele assim se referir.
O empregado que se refere ao autor por “você”, pode estar sendo
cortês, posto que “você” não é pronome depreciativo. Isso é formalidade,
decorrente do estilo de fala, sem quebra de hierarquia ou incidência de
insubordinação. Fala-se segundo sua classe social. O brasileiro tem
tendência na variedade coloquial relaxada, em especial a classe
“semi-culta” , que sequer se importa com isso.
Na verdade “você” é variante – contração da alocução – do tratamento
respeitoso “Vossa Mercê”. A professora de linguística Eliana Pitombo
Teixeira ensina que os textos literários que apresentam altas
freqüências do pronome “você”, devem ser classificados como formais. Em
qualquer lugar desse país, é usual as pessoas serem chamadas de “seu” ou
“dona”, e isso é tratamento formal.
Urge ressaltar que tratamento cerimonioso é reservado a círculos
fechados da diplomacia, clero, governo, judiciário e meio acadêmico,
como já se disse. A própria Presidência da República fez publicar Manual
de Redação instituindo o protocolo interno entre os demais Poderes. Mas
na relação social não há ritual litúrgico a ser obedecido. Por isso que
se diz que a alternância de “você” e “senhor” traduz-se numa questão
sociolingüística, de difícil equação num país como o Brasil de várias
influências regionais.
Ao Judiciário não compete decidir sobre a relação de educação,
etiqueta, cortesia ou coisas do gênero, a ser estabelecida entre o
empregado do condomínio e o condômino, posto que isso é tema interna
corpore daquela própria comunidade.
Isto posto, por estar convicto de que inexiste direito a ser
agasalhado, mesmo que lamentando o incômodo pessoal experimentado pelo
ilustre autor, julgo improcedente o pedido inicial, condenando o
postulante no pagamento de custas e honorários de 10% sobre o valor da
causa. P.R.I. Niterói, 2 de maio de 2005.
ALEXANDRE EDUARDO SCISINIO
/Juiz de Direito/
/Juiz de Direito/
Nota do blog: Um Juiz de Direito que perde seu tempo e aciona o poder judiciário exigindo indenização porque foi tratado por "você", só mostra o quanto são pretensiosos alguns membros do nosso poder judiciário.
Como professor, convivo com vários profissionais que adquiriram esse título e que, em nenhum momento demonstram preocupação em serem chamados de "doutor".
São tratados pelo nome ou simplesmente chamados de "professor" pelos alunos e demais colegas de trabalho e nem por isso se sentem diminuídos.
É óbvio que existem muitos profissionais que adquirem esse título e fazem questão de ressaltá-los, até mesmo quando enviam um e-mail, assinando no final como "Doutor mané não sei das quantas".
Pior de tudo é ver bacharéis em direito se arvorando de "doutores", quando, simplesmente, terminam um curso de graduação.
Infelizmente, esse é o Brasil. Uma sociedade dos títulos sonoros e vazios.
Simplesmente, lamentável.
Nenhum comentário:
Postar um comentário